A importância da colaboração público-privada no enfrentamento dos desastres climáticos

Conheça as estratégias de colaboração intersetoriais que estão criando soluções inovadoras para lidar com os eventos extremos no Brasil

Chuvas no Rio Grande do Sul em 2024. Crédito da Imagem: Empresa Brasil de Comunicação (EBC), via ClimaInfo

Os desafios impostos pelas mudanças climáticas têm se intensificado, colocando em risco a infraestrutura, a economia e a segurança de comunidades ao redor do mundo. No Brasil, os extremos climáticos, como secas prolongadas, enchentes e tempestades severas, demonstram que o país já vive os efeitos desse fenômeno. Diante desse cenário, é essencial que diferentes atores da sociedade se unam para mitigar e se adaptar a essas mudanças, criando soluções que envolvam desde o setor público até a academia, sociedade civil e o setor privado.

O setor privado, em particular, pode desempenhar um papel fundamental, contribuindo para a agenda climática de maneira proativa e estratégica. Ao alinhar suas ações com os princípios do desenvolvimento sustentável, as empresas podem impulsionar mudanças significativas, seja por meio de investimentos em inovação, apoio a políticas públicas, ou no financiamento de iniciativas voltadas à adaptação e mitigação dos impactos climáticos. Esse engajamento não apenas fortalece a resiliência das comunidades, mas também ajuda as próprias companhias a lidarem com os riscos econômicos associados a eventos climáticos extremos.

Neste contexto, explorar as formas de contribuição do setor privado se torna fundamental para compreender como as empresas podem estruturar parcerias eficazes com o setor público para o enfrentamento das mudanças climáticas. 

Confira mais a seguir! 

Investimentos estratégicos para mitigar os riscos climáticos: a colaboração público-privada

Sobrevôo das áreas afetadas pelas chuvas em Canoas (RS), em maio de 2024. Crédito da Imagem: Ricardo Stuckert

A capacidade limitada do setor público para lidar com os desafios climáticos exige a formação de parcerias que permitam a superação de barreiras estruturais, como a falta de capital e de planejamento de longo prazo. Com os impactos das mudanças climáticas se intensificando, é evidente que a colaboração entre os setores público e privado é essencial para garantir uma resposta eficaz. No entanto, essa articulação enfrenta desafios, como a burocracia e o desalinhamento de expectativas, tornando essencial o fortalecimento do diálogo e a criação de canais de cooperação mais ágeis. 

O engajamento do setor privado nessa pauta tem crescido mundialmente nos últimos anos, como mostram os dados do Chief Executives for Corporate Purpose (CECP), organização internacional que acompanha e divulga dados sobre a atuação social de empresas americanas. Nos EUA, entre 2019 e 2022, os investimentos corporativos voltados para o alívio humanitário quase dobraram, com metade das corporações aportando volumes iguais ou superiores a US$ 637,5 mil em 2022. A priorização do alívio humanitário nas carteiras de projetos sociais passou de 2% em 2019 para 4,3% em 2022, o que demonstra um movimento claro das empresas para incorporar a resposta a catástrofes como parte de suas estratégias de investimento social

No Brasil, a tendência é parecida. A pesquisa do Benchmarking do Investimento Social Corporativo (BISC), conduzida anualmente pela Comunitas, revelou que 85% das empresas da Rede destinaram recursos para apoio emergencial em 2023 após eventos climáticos extremos. O valor mediano desses investimentos foi de R$ 417 mil, com as unidades de negócio investindo mais do que institutos e fundações corporativas, com medianas de R$ 742,7 mil e R$ 325,9 mil, respectivamente. Esse aporte de recursos tem sido fundamental para o alívio humanitário e a mitigação dos impactos das catástrofes, indicando que o setor privado brasileiro está cada vez mais engajado em ações emergenciais e estruturantes.

Isso porque o tema tem uma enorme relevância econômica. De acordo com o Relatório de Riscos Globais do World Economic Forum (WEF) de 2024, os eventos climáticos extremos são apontados como um dos principais riscos à economia global na próxima década, tanto no curto quanto no longo prazo. No horizonte de 2 anos, por exemplo, esses fenômenos ocupam pelo menos a segunda posição entre os maiores riscos para diversos stakeholders, incluindo setor privado, governos e organizações internacionais. 

Esse cenário impõe a necessidade de investimentos preventivos, como aponta o Adaptation Gap Report 2023, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), que demonstra que cada US$ 1 bilhão investido em adaptação ao risco de inundações costeiras pode gerar uma economia de US$ 14 bilhões em danos econômicos. O fortalecimento da capacidade de resposta do setor privado frente a desastres climáticos, portanto, não é apenas uma responsabilidade social, mas também uma necessidade estratégica para mitigar riscos econômicos e sociais futuros.

À medida que as empresas são chamadas e se colocam cada vez mais para participar dos esforços de resposta à crise climática, é importante compreender quais as capacidades do setor privado de contribuir para resultados sociais positivos. Sob a ótica das políticas públicas e das comunidades atingidas por desastres, a participação mais ativa do setor privado na agenda é essencial, pois disponibiliza recursos absolutamente estratégicos para viabilizar medidas de adaptação

A seguir, confira algumas das contribuições do setor corporativo para a agenda climática:

  • Informações e conhecimentos sobre gestão de riscos já sistematizados e aplicados em seus processos operacionais;
  • Tecnologias e soluções que podem ser colocadas a serviço da sociedade e da gestão pública, como sistema de monitoramento meteorológico e de dados georreferenciados;
  • Capacidade de mobilização e influência de outros atores para a gestão de riscos climáticos, por exemplo, atuando junto às cadeias de valor;
  • Capacidade de investimento, viabilizando medidas capital-intensivas por meio de projetos próprios e de parcerias público-privadas (PPPs);
  • Desenvolvimento e oferta de instrumentos financeiros para a gestão e transferência de riscos climáticos e viabilização de investimentos em adaptação, como seguros, linhas de crédito e fundos com critérios climáticos.

Quer saber como sua empresa pode contribuir para um futuro mais sustentável e resiliente? Baixe agora o ‘Guia para o Enfrentamento às Emergências Climáticas: Estratégias de Colaboração Público-Privada’!

Estratégias corporativas para o enfrentamento dos desafios climáticos

Doação de cestas básicas durante chuvas do Rio Grande do Sul em 2024. Crédito da Imagem: Geovana Benites/Matinal

O papel das empresas com forte presença local se destaca no apoio às comunidades afetadas por mudanças climáticas, alavancando sua capilaridade e o conhecimento dos territórios onde atuam. As dotações estratégicas das companhias permitem a adoção de procedimentos mais ágeis, como a reorientação de recursos e processos, o que é essencial em momentos de crise. Essas capacidades se refletem nas estruturas de investimento social privado, que, cada vez mais, incorporam práticas de justiça climática em suas estratégias, como destacado pelo IDIS (2024), ao identificar o investimento social privado como correlacionado ao bom desempenho ESG das empresas brasileiras. 

No entanto, a série histórica do BISC aponta para uma lacuna significativa em frentes mais estruturantes da adaptação climática. Apesar de 85% das empresas pesquisadas pela Rede BISC terem alocado recursos emergenciais para extremos climáticos em 2023, apenas 25% apoiaram a gestão pública, e 13% se dedicaram a ações como fortalecimento da sociedade civil ou desenvolvimento de resiliência nas comunidades locais.

Essa realidade demonstra um grande potencial para que o setor privado atue de forma mais estratégica na agenda climática. Um levantamento realizado pelo BISC junto à sua Rede revela que, enquanto as doações emergenciais se concentram em itens essenciais, como cestas básicas, a articulação com a sociedade civil ainda é predominante (82%), em linha com a literatura que reconhece essa conexão como fundamental para apoiar territórios onde as empresas têm pouca inserção. Outras práticas, como a doação de serviços, destinação de recursos orçamentários específicos para emergências ou articulação com o poder público local, são menos frequentes, revelando a necessidade de expandir o escopo de ação das empresas diante da crise climática.

A seleção dos territórios apoiados, predominantemente baseada na proximidade das operações das empresas e em dados e evidências (64%), também pode ser aprimorada ao incorporar mais articulação com atores da sociedade civil e poder público, conforme os dados do BISC 2023 indicam. Este enfoque, embora eficaz em alguns casos, pode limitar a capacidade de resposta das empresas em uma escala nacional – e até mesmo mundial – diante da magnitude dos impactos climáticos. 

Boas práticas

B3 Social

A B3 Social define o apoio a iniciativas emergenciais e assistenciais como um dos pilares estratégicos de seu Investimento Social Corporativo, focando no alívio de necessidades urgentes de pessoas e comunidades vulneráveis em todo o Brasil. 

Por meio de parcerias com organizações da sociedade civil (OSCs) aprovadas em compliance, a B3 Social agiliza a distribuição de recursos filantrópicos em situações de desastre, como ocorreu no Acre, Espírito Santo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, que enfrentaram chuvas extremas em 2023. 

Foram doados R$ 8 milhões, incluindo 60 mil cestas básicas e 3 mil cartões-alimentação. A atuação nacional é fortalecida por essas parcerias, permitindo uma resposta rápida e eficaz, conforme detalhado no Relatório Anual 2023 da organização. 

Instituto Ultra

O Instituto Ultra considera o apoio a emergências causadas por eventos climáticos extremos como um de seus eixos estratégicos, com 20% do orçamento anual reservado para essa finalidade, conforme o Relato Integrado de 2023. Sua atuação se baseia em três pilares: reserva de fundos específicos, parceria com a sociedade civil para agilizar a distribuição de doações, e apoio a territórios próximos às unidades operacionais do Grupo Ultra. 

O Instituto também implementou processos rápidos para aquisição de itens essenciais, envolvendo o time de compras no mapeamento de fornecedores aprovados. As doações são distribuídas por organizações sociais de base, indicadas por parceiros maiores e aprovadas pelas diretrizes éticas e anticorrupção do Grupo. Além disso, os negócios do Grupo podem doar seus produtos e serviços. 

Instituto C&A

O Instituto C&A considera o apoio humanitário um eixo estratégico de seu Investimento Social, realizando doações emergenciais em crises ambientais, sociais e sanitárias. Em 2023, suas ações beneficiaram mais de 5,2 mil pessoas, com foco em famílias impactadas por chuvas, combate à fome e pobreza menstrual. 

Sua Teoria de Mudança orienta essas intervenções, priorizando territórios com unidades da C&A, mobilizando recursos próprios, da cadeia de valor e parceiros. A estrutura de pagamento de parceiros acelera o repasse de recursos para organizações sociais. 

Em 2022, após as chuvas em Petrópolis (RJ), o Instituto criou o ‘Fundo de Apoio às Costureiras de Petrópolis’, destinando mais de R$ 65 mil para apoiar a recuperação das costureiras locais, fornecendo suporte psicológico, novos equipamentos, vale-alimentação e vale-tecido por 3 meses.

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