Mudanças climáticas: qual é o cenário do Brasil e o que está por vir?

Com o aumento da frequência e intensidade de desastres climáticos no Brasil, medidas de adaptação e mitigação são cruciais para proteger vidas, reduzir prejuízos econômicos e garantir a resiliência do país

Deslizamentos de terra na Região Serrana do Rio de Janeiro de 2011. Crédito da Imagem: Agência Brasil

O Brasil, como parte do sistema climático global, não está imune aos impactos das mudanças climáticas. A intensificação de eventos extremos, como secas prolongadas, inundações severas e ondas de calor, têm se tornado cada vez mais frequentes em diversas regiões do país e as projeções indicam que, sem uma ação mais ambiciosa de mitigação e adaptação, os impactos socioeconômicos e ambientais no Brasil podem se agravar nas próximas décadas.

Considerando a vulnerabilidade de diversos setores, como a agricultura, e a desigualdade social presente em muitas regiões, é fundamental analisar o cenário atual e futuro do Brasil frente às mudanças climáticas, buscando soluções para promover a adaptação e a resiliência do país.

Histórico das mudanças climáticas

O cenário global de desastres climáticos tem se tornado cada vez mais alarmante à medida que os impactos das mudanças climáticas se intensificam. Desde a Revolução Industrial, o aumento das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) tem aquecido a atmosfera terrestre e alterado os padrões climáticos. O último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), publicado em 2023, destacou que a temperatura global atingiu níveis sem precedentes nos últimos 2.000 anos, e que os últimos 50 anos foram os mais quentes desde 1970. Além disso, as concentrações atmosféricas de dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) atingiram seus níveis mais altos em milhões de anos.

Com isso, eventos climáticos extremos como enchentes, secas, incêndios florestais e ondas de calor têm ocorrido com maior frequência e intensidade. Esses desastres não afetam apenas o meio ambiente, mas também resultam em graves consequências sociais e econômicas, especialmente para as populações mais vulneráveis. Estima-se que, atualmente, 3,4 bilhões de pessoas vivem em contextos de alta vulnerabilidade climática, muitas das quais em condições de desigualdades sociais, econômicas e de gênero – o que agrava ainda mais os impactos desses eventos.

Panorama dos impactos climáticos no Brasil

O cenário de desastres climáticos no Brasil tem se intensificado nos últimos anos, refletindo tanto as mudanças climáticas globais quanto a vulnerabilidade específica de diferentes regiões do país. Desastres naturais como inundações, deslizamentos, secas e incêndios florestais são cada vez mais frequentes, resultando em perdas humanas, sociais e econômicas.

Entre 1991 e 2023, o Brasil registrou 5.142 mortes relacionadas a desastres climáticos, segundo a Defesa Civil e a base de dados EM-DAT. A maior tragédia ocorreu em janeiro de 2011, quando uma série de deslizamentos e enchentes devastou a Região Serrana do Rio de Janeiro, especialmente nos municípios de Petrópolis, Nova Friburgo e Teresópolis. Apenas esta ocorrência resultou em 918 mortes, sendo considerado um dos desastres naturais mais avassaladores da história recente do país e um dos maiores deslizamentos de terra dos últimos 100 anos em todo o mundo. Além das perdas humanas, as consequências econômicas também foram severas, com prejuízos estimados em R$ 1,7 bilhão, destinados principalmente a obras de contenção de encostas e readequação de áreas de risco.

De acordo com o World Risk Report de 2023, o Brasil ocupa a 40ª posição entre 193 países avaliados em termos de vulnerabilidade a desastres, levando em consideração fatores como exposição, capacidade de resposta e adaptabilidade. Embora não esteja entre os países mais vulneráveis globalmente, o Brasil enfrenta desafios significativos, principalmente em relação aos desastres hidrológicos, como inundações e enchentes. Segundo o Aqueduct Global Flood Analyzer, o Brasil é o 11º país com maior população exposta a inundações fluviais, com cerca de 250 mil pessoas impactadas anualmente.

Panorama regional do impacto das mudanças climáticas no país

Seca na Bahia em janeiro de 2024. Crédito da Imagem: Jornal O Expresso

As regiões mais vulneráveis do país são o Sudeste, o Sul e o Nordeste, que concentram a maioria dos desastres hidrológicos e climatológicos. No Sudeste, desastres como chuvas intensas, enxurradas e deslizamentos são frequentes, especialmente durante o verão, quando as chuvas se intensificam. Minas Gerais é o estado mais afetado por esses eventos, com um histórico de 7.995 desastres entre 1991 e 2022. Em janeiro de 2020, o Estado enfrentou seu mês mais chuvoso da história, com um acumulado de 935 milímetros de precipitação, três vezes a média histórica, que causou a morte de 74 pessoas e prejuízos de R$ 1,3 bilhão, afetando milhares de residências e infraestruturas.

A região Sul também sofre com uma alta incidência de desastres, especialmente relacionados a enxurradas e ciclones. A seca é outro desafio predominante, que impacta a agricultura e a pecuária. Porém, entre 2021 e 2022, fortes chuvas atingiram o Rio Grande do Sul, levando 30 pessoas à morte e ao desalojamento de milhares. Os prejuízos materiais foram estimados em  R$ 31 bilhões de reais, destacando a vulnerabilidade do Estado às mudanças climáticas e à falta de preparo para lidar com eventos extremos.

O Nordeste brasileiro, por sua vez, é uma das regiões mais vulneráveis à estiagem e à seca. Entre 1991 e 2023, a seca afetou mais de 4.234 localidades na Bahia, Estado que lidera o ranking de desastres relacionados à escassez de água. A seca severa de 2023-2024 foi a pior dos últimos 40 anos, com mais de 107 mil animais mortos por falta de água e alimentos, e prejuízos superiores a R$ 1 bilhão. Os impactos econômicos e sociais da seca são exacerbados pela desigualdade socioeconômica da região, que depende fortemente da agricultura de subsistência.

Vale ressaltar que os desastres não assolam apenas as regiões mais vulneráveis, as demais regiões, como o Norte do Brasil, também tem enfrentado desafios relacionados a desastres hidrológicos, como inundações, além de secas severas em áreas como o oeste do Pará. Em 2023, a seca no Pará afetou a produção agrícola, reduziu a quantidade de peixes e prejudicou a navegação nos rios, que são fundamentais para a mobilidade e o sustento das populações ribeirinhas. Até julho de 2024, mais de 900 mil pessoas na região Norte foram impactadas por secas, com prejuízos econômicos superiores a R$ 1,1 bilhão.

Os incêndios florestais no Brasil também merecem destaque, especialmente no Pantanal, que tem sido devastado por queimadas recordes. Em 2020, os incêndios no Pantanal aumentaram em 210% em relação ao ano anterior, e em 2024, a área queimada foi 54% maior do que a registrada em 2020, que já havia sido o pior ano da história do bioma. Esses incêndios não apenas destroem a biodiversidade, mas também afetam o modo de vida das comunidades locais e a economia, que depende do turismo e da agricultura.

Além das consequências imediatas, os desastres climáticos no Brasil revelam um cenário preocupante de falta de planejamento e preparação por parte das autoridades públicas. A rápida urbanização, especialmente nas grandes cidades, resultou na ocupação desordenada de áreas de risco, como encostas e regiões próximas a rios, aumentando a vulnerabilidade da população a desastres naturais. 

O que está por vir?

Estudos recentes, como o Adaptation Gap Report (2023), apontam que o Brasil enfrentará um aumento na frequência e severidade de secas, chuvas torrenciais e temperaturas extremas nas próximas décadas. Diante desse cenário, a resposta aos desastres climáticos deve ser coordenada entre governo, setor privado e sociedade civil

A crescente intensidade dos eventos extremos, aliada às desigualdades sociais e à falta de infraestrutura adequada, coloca milhões de brasileiros em situação de risco. É urgente que o país adote medidas rápidas e eficazes de adaptação às mudanças climáticas, investindo em soluções sustentáveis que garantam a segurança e o bem-estar da população frente aos desafios futuros.

As populações que vivem em áreas de risco, especialmente nas periferias das grandes cidades, estão entre as mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas. A desigualdade social no Brasil intensifica esses impactos, pois regiões com infraestrutura inadequada, saneamento básico deficiente e falta de planejamento urbano são as mais suscetíveis a enchentes, deslizamentos e outros desastres. Isso perpetua um ciclo de vulnerabilidade, em que as comunidades mais pobres, já enfrentando condições de moradia adversas, são as que mais sofrem e têm menos recursos para se recuperar.

Soluções para o futuro: mitigação e adaptação

O Brasil precisa investir em políticas que promovam a resiliência dos territórios e das comunidades, adotando medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Segundo a Climate Policy Initiative, o custo da inação será muito maior do que o da ação, e investir agora em estratégias de adaptação não só reduzirá os prejuízos econômicos futuros, como também garantirá maior proteção para as populações mais vulneráveis, preparando o país para enfrentar os desafios climáticos que estão por vir.

Uma das soluções sugeridas por especialistas é a implementação de sistemas de alerta precoce em áreas de risco. Segundo a Global Commission on Adaptation (GCA), um aviso emitido com 24 horas de antecedência pode reduzir os impactos de desastres em até 30%. Esse tipo de medida é essencial para evitar tragédias maiores. 

Além disso, o Brasil precisa fortalecer sua infraestrutura, adaptando-a para resistir a eventos climáticos extremos. Cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, que sofrem com enchentes regulares, precisam de sistemas de drenagem mais eficientes, além de políticas de ocupação do solo que levem em consideração as áreas de risco.

Investimentos em agricultura resiliente também são fundamentais. O Adaptation Gap Report estima que um investimento de US$ 16 bilhões por ano em práticas agrícolas adaptativas poderia evitar a fome de cerca de 78 milhões de pessoas globalmente. No Brasil, onde a agricultura é um dos pilares da economia, a adoção de práticas sustentáveis e resistentes às mudanças climáticas é essencial para garantir a segurança alimentar da população.

Quer entender melhor o cenário das mudanças climáticas no Brasil e como o setor público e privado podem colaborar para adaptar os territórios? Baixe gratuitamente o Guia para o Enfrentamento às Emergências Climáticas: Estratégias de Colaboração Público-Privada.

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